21.9.10

Recordações de 1989



Em 1984, a população brasileira sonhava em voltar a eleger diretamente o presidente da República. Naquele ano, o movimento das Diretas Já tomou de assalto o país, com manifestações gigantescas nas maiores cidades brasileiras. Mas a emenda não passou, e o eleitorado teve que esperar cinco anos para fazer valer sua vontade. De certa forma, a espera valeu a pena.

As eleições presidenciais de 1989 foram as primeiras pós-redemocratização, e as primeiras depois de 29 anos - em 1960, Jânio Quadros foi eleito com votação massiva para renunciar ao cargo depois de apenas sete meses na Presidência. As eleições de 1989 registraram um recorde de candidatos, imbatível até hoje - nada menos do que 22 postulantes ao cargo, onde havia desde nomes conhecidos como Leonel Brizola (PDT), Mário Covas (PSDB), Paulo Maluf (PDS) e Ulysses Guimarães (PMDB); passando por famosos alternativos como Guilherme Afif Domingos (PL), Roberto Freire (PCB), Aureliano Chaves (PFL), Ronaldo Caiado (PSD) e Fernando Gabeira (PV); até bizarrices como José Alcides Marronzinho (PSP), Enéas Carneiro (PRONA) e Lívia Maria de Abreu (PN) - por sinal, a primeira mulher a concorrer à presidência da República. Nenhum dos candidatos - nem mesmo o do PMDB - queria atrelar seu nome ao do então presidente José Sarney (que assumiu o cargo em 1985, como vice de Tancredo Neves, impossibilitado de tomar posse por problemas de saúde; foi efetivado com a morte do eleito), com a popularidade em baixa. Mas um ex-governador de Alagoas, que tinha a alcunha de "caçador de marajás", e um deputado federal, conhecido líder sindical, foram as grandes estrelas daquelas eleições.

Fernando Collor (PRN) começou de forma discreta, com poucas intenções de voto - nos primeiros meses de campanha, Brizola, Covas e Ulysses eram vistos como favoritos. Mas a ostensiva campanha, focada no combate à corrupção quando governador alagoano (daí o apelido), somada ao apoio (declarado ou não) de gente graúda no mundo político e midiático, fez Collor subir nas pesquisas. Ao mesmo tempo, a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ganhava simpatia de grande parte da classe artística, fazendo que ela também crescesse no conceito popular. Mesmo assim, teve que lutar com Brizola para ir ao segundo turno - tanto que teve menos de 500 mil votos a mais que o pedetista no primeiro turno, realizado no dia 15 de novembro, dia que marcou o centenário da Proclamação da República. Brizola teve 11.168.228 votos; Lula, 11.622.673. Já Collor se garantiu no segundo turno com tranquilidade, com 22.611.011 votos.

O segundo turno conflagrou uma das maiores efervescências políticas da história brasileira. Ressalte-se que, naquela época, o mundo vivia grandes transformações. Naquele mês de novembro, ruiu o Muro de Berlim, contribuindo para a queda do império soviético, que liderava o bloco da Europa Oriental. Enquanto isso, do outro lado do Atlântico, houve quem relacionasse a candidatura de Lula com algo decadente como o comunismo. Além disso, a polarização então existente considerava que a eleição era um confronto de racionais contra meros sonhadores. Ainda houve a questão dos ataques pessoais dos dois lados, sendo que o mais famoso foi o uso por Collor, em seu programa eleitoral, da ex-mulher de Lula, que o acusou de querer abortar uma filha do casal. Isso tudo, somado à inexperiência e às convicções políticas de Lula (que realmente causavam medo a muitas pessoas), deram a vitória a Collor, em 17 de dezembro de 1989 - com 35.089.998 votos, contra 31.076.364 dados a Lula.

Collor assumiu o cargo em 15 de março de 1990. Foi um mandato polêmico, cheio de autopropaganda com demonstrações de vitalidade que acabariam se mostrando infrutíferas. O confisco da poupança dos brasileiros, logo nos primeiros dias de governo, como estratégia de combate à inflação, era uma amostra do que estava por vir. Em 1992, um irmão do presidente deu entrevista acusando-o de atos ilícitos, junto com o empresário Paulo César Farias. Paralelamente a isso, comprovações de corrupção surgiam por todos os lados. A situação do presidente ficou insustentável e, com isso, Collor sofreu processo de impeachment, o que causou seu afastamento do poder em 2 de outubro de 1992. Sucedido por Itamar Franco, renunciou a qualquer tentativa de voltar ao poder em 29 de dezembro daquele mesmo ano. Foi julgado e suspenso da política por oito anos.

Muitos dizem que a nossa primeira incursão presidencial depois de quase três décadas foi um fracasso. Contudo, isso tudo serviu para nosso amadurecimento político - que, segundo vejo, porém, foi meramente fugaz. Pelo que percebo, infelizmente, a população brasileira parece fazer questão de querer depender dos bolsas-qualquer-coisa da vida.

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